domingo, 7 de março de 2010

DEPOIMENTO DE UM ESPÍRITO

O VICIADO EM

DEPOIS DA MORTE


Não pude me furtar ao depoimento, solicitado com tanto amor por quem tanto fez por mim. No entanto, preferia não falar. Sinto-me desanimado ao pensar que outros que hoje são o que fui, sem dúvida, não acreditarão, como eu também não teria acreditado. Também me pediram para não carregar nas cores do meu relato. Mas como isto é possível? Pois vou falar de dor, de muita dor!
Deixei um corpo exausto, cujos rins se renderam ao assalto de tanto veneno. Minha vida de 45 anos me parecia longuíssima. Um cansaço enorme e um incômodo enorme. Queria poder despir-me do próprio eu, queria morrer, mas morrer de verdade! Queria não existir, não pensar, não sentir.
Arrastei-me para fora do corpo e vi num ambiente escuro e viscoso. Ainda me sentia ligado à máquina orgânica e assim fiquei um longo tempo. Até que um bando de entidades me libertaram do corpo, levando-me com elas. Pensei que ainda estava na Terra, e que era vítima de sequestro. Cocainômano e alcoólatra, já estava atormentado pela sede (não sei definir melhor) devoradora da droga. Tinha alucinações, nesses momentos piores rolava no chão e rasgava-me todo. Meus companheiros me levavam com eles por uma estrada longa e sombria. Fomos, caindo e levantando. Um se apoiava no outro e gritávamos dementados.
Vi-me chegar em um apartamento onde, na sala, se reunia um pequeno grupo de viciados da Terra. Corri para eles e a palavra era "esfomeado". Queria aspirar, o pó branco, tentava tirar das mãos do sujeito diante de mim o papelzinho em que ele, cuidadosamente, sustentava o valioso pozinho. Meus companheiros me ensinaram, então como sorvê-lo através do centros de força do rapaz. Ficamos lado a lado no barato da droga.

Foram anos assim e depois que minha mãe me encontrou, fui hospitalizado num quarto que era uma cela gradeada. Amarraram-me, pés e mãos, e eu gritava dia e noite. Via o rosto de mamãe encostado às grades, suas grandes lágrimas correndo e xingava, odiava sua intervenção. Não sei quanto tempo passei assim. Depois fui desamarrado e levado às sessões longas e dolorosas de desintoxicação.
Espanto-me ao saber que são quase 20 anos que estou aqui. Não estou curado ainda. Tenho alucinações ocasionais e recaídas de desespero. Eles dizem que precisarei reencarnar para que o corpo de carne, atue como mata-borrão, filtrando todo veneno que, voluntariamente destrambelhei o meu corpo espiritual. Dizem que talvez uma vida não seja suficiente. Tenho grandes crises de depressão, mas aqui o tratamento é intensivo e todos me apóiam. Pergunto-me todo dia como pude fazer isso comigo mesmo. Não tenho controle sobre meu corpo perispiritual. Caio muito e tenho crises epileptóides.

Que posso dizer a vocês? Previnam-se, amem-se e a seus filhos. Façamos uma família forte e amorosa, na qual cada membro encontre apoio no afeto e não na química. Engajem-se em campanhas de esclarecimento nas escolas, em toda a parte. Mostrem o lado preto do pó branco! Não posso mais...orem por mim!

Paulo Edu

Sentimentos e Conflitos
Grace khawali

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